Receitas Saudáveis para seu Cão — eBook
eBook • Receitas Caseiras

Receitas Saudáveis para seu Cão — mais energia, pelagem e bem-estar

Um guia prático com receitas caseiras balanceadas, ingredientes naturais e dicas simples para você preparar refeições nutritivas que seu cachorro vai amar.

  • Ingredientes naturais que realmente nutrem
  • Receitas fáceis e balanceadas — passo a passo
  • Dicas para prevenir problemas digestivos e alergias
  • Mais disposição e pelagem saudável
Fácil de seguir Passo a passo ilustrado
Rápido Receitas em minutos
Seguro Compras pela Hotmart

O que você recebe

No eBook você encontrará receitas balanceadas, orientações sobre ingredientes, porções por peso/idade, e dicas para adaptar as receitas conforme necessidades do seu pet.

Perguntas frequentes

O eBook traz receitas para cães adultos e filhotes (com adaptações). Para casos específicos de saúde, consulte o veterinário.

Publicado por Jefferson Peixoto • Página original do produto na Hotmart

Arquivo do blog

Capítulo 53 - Correndo Pela Vida do Meu Dono

Quando cada passo é um grito de socorro e o amor transforma as patas em asas.

Capítulo 53 - Correndo Pela Vida do Meu Dono

Há momentos na vida em que tudo parece se aquietar para que o inesperado aconteça. Às vezes, é uma palavra que fere; outras, um abraço que cura. E há momentos em que o próprio ar falta, a terra treme, e o instinto precisa gritar mais alto do que o medo. Nesta história, precisei correr como nunca correra antes. Corri com o coração na boca, com cada pata batendo no chão como um tambor apressado, buscando salvar quem sempre me salvou: meu garoto. Correndo pela vida do meu dono.

Uma tarde de tranquilidade

Era fim de tarde de um sábado. O sol já inclinava-se no horizonte, deixando um rastro de luz dourada que atravessava as janelas da sala. O aroma de bolo de fubá recém-assado se espalhava pela casa, misturando-se ao perfume de café recém-passado. O pai de Diego lia um livro na varanda, sentindo o vento fresco bater em seu rosto. A mãe se dedicava aos cuidados com as plantas, aparando folhas secas e conversando com suas flores, como costumava fazer. E Diego… Diego estava no quintal, com os olhos brilhosos, observando uma borboleta que pousava e levantava voo. Ele ria sozinho, encantado com as cores e o movimento.

Eu, Sombra, descansava sob a sombra de uma árvore, com a cabeça apoiada nas patas. Observava cada movimento, captando cada cheiro: o cheiro de grama cortada, de terra úmida, de bolo, de borboleta e também aquele perfume doce e familiar de Diego. Eu respirava o ar com tranquilidade, deixava minhas orelhas vibrarem com o som de vozes distantes, meu coração seguia o ritmo da paz. Era um de aqueles dias em que eu pensava que poderíamos ficar ali eternamente.

Diego olhava a borboleta, e eu o olhava. Sua cadeira de rodas estava parada, e ele mexia de leve a mão direita, tentando acompanhar o voo do inseto. Tudo estava calmo, até que uma voz interrompeu a tranquilidade.

– Diego, você pode pegar o pacote de açúcar na cozinha para mim? – gritou a mãe, sem sair do quintal.

Diego sorriu e respondeu:

– Posso, mãe!

Ele começou a empurrar as rodas com as mãos e, em seguida, me olhou.

– Me ajuda, Sombra! – disse, rindo. – Vamos lá!

Eu me levantei, sacudi o corpo e me posicionei ao lado dele. Segurou minha coleira com firmeza, como já era hábito, para que eu pudesse ajudar a guiar a cadeira pela casa. Entramos juntos, passando pela porta da cozinha. O cheiro de bolo ficou mais forte, e o calor do forno me envolveu. A mãe cantava uma canção enquanto lavava um pote na pia. O pacote de açúcar estava no armário, em uma prateleira alta. Diego esticou a mão, tentando alcançar. Eu fiquei atento. Ele inclinou-se um pouco, mas, ao perceber que não alcançaria, pediu:

– Sombra, me ajuda!

Eu me levantei, coloquei as patas dianteiras apoiadas no armário. Minha língua tentava abocanhar o saco de açúcar, mas eu era um cachorro; não tinha mãos. O pacote estava fechado, liso, e minha língua escorregava. A mãe riu, percebeu a cena, e veio pegar o açúcar. Entregou nas mãos de Diego.

– Vocês são engraçados! – disse ela, sorrindo.

Diego sorriu também. E, nesse momento, senti um cheiro diferente. Um cheiro metálico, talvez. Um farfalhar de tecido. Ouvi um barulho seco, algo como metal batendo. Olhei para trás. A mesa estava vazia, mas sobre ela havia uma faca grande, que a mãe usara para cortar a massa do bolo. A faca estava de ponta, com a lâmina voltada para fora. Diego estava com o pacote de açúcar nas mãos, e, ao se virar, tocou a faca. Ela caiu no chão, deslizando até bater na perna de Diego. O corte não foi profundo, mas suficiente para tocar a pele. O contato da lâmina com a pele produziu um som abafado, e eu ouvi um grito:

– Aí!

O início da corrida

A lâmina deixou um risco vermelho na perna de Diego, logo abaixo do joelho. Um corte. Não era profundo, mas começou a sangrar. Sangue. Para um humano, um corte na perna pode ser algo simples. Mas, para Diego, que tem uma condição que dificulta a coagulação, um corte pode ser perigoso. Eu não entendo medicina; entendo o cheiro. E o cheiro de sangue, para mim, é intenso, ferroso, inconfundível. Senti o aroma invadir a cozinha, misturando-se ao cheiro de bolo e açúcar. Um alarme soou dentro de mim. O corte parecia pequeno, mas, para ele, poderia ser muito.

A mãe, ao ver, ficou pálida. Ela largou a faca e o pote, e correu até Diego.

– Ai, meu Deus! – ela exclamou, pegando a toalha mais próxima para pressionar o corte. – Calma, filho! Calma!

Diego olhou para o corte e, em segundos, começou a chorar. O sangue escorria pela toalha, manchando de vermelho. A mãe pressionou, mas viu que o corte não parava de sangrar. O pai correu para dentro ao ouvir o grito. Sua expressão mudou ao ver o vermelho.

– Foi a faca! – a mãe explicou, com a voz trêmula. – Ele cortou a perna. Precisamos do kit de primeiros socorros e provavelmente do hospital. Parece que… – ela travou. – Está sangrando demais.

O coração de Diego disparou. Sua respiração ficou rápida. Ele murmurava “Desculpa, desculpa” sem parar, como se tivesse feito algo errado. O pai pegou a toalha e apertou mais forte. Sangue começou a pingar no chão. A mãe correu para ligar para a ambulância. Mas, ao pegar o telefone, percebeu que não havia sinal – a chuva dos dias anteriores tinha danificado as linhas. O pai correu até a sala para pegar o celular, mas era um modelo antigo, que muitas vezes falhava no sinal. Eles tentavam ligar, mas não conseguiam sinal.

– Não conseguimos ligar – disse o pai, com a voz embargada. – O sinal deve estar fora. Preciso correr até a casa do vizinho ou até o posto de saúde.

A mãe, com o telefone no ouvido, chorava e pressionava a toalha. Diego estava pálido. Eu olhava para a perna dele. O corte era pequeno, mas o sangue era muito. E o cheiro, inebriante. Meu instinto dizia que tínhamos que agir rápido. O pai olhou ao redor, desesperado. Aquela rua era longa. O posto de saúde ficava a quatro quarteirões. A casa mais próxima com telefone funcional era a do senhor Manuel, que ficava três casas depois. Ele pensou em ir, mas, ao se levantar, Diego disse:

– Pai, não me deixa.

Então o pai hesitou. A mãe estava em choque. Eu percebia o medo no ar. Eles precisavam de alguém que corresse. E eu, de repente, entendi: Eu podia correr. Não sabia falar, mas podia buscar ajuda. Podia correr mais rápido do que qualquer humano ali. Podia percorrer a rua, chegar ao posto, chamar a atenção. Meu coração bateu forte. Olhei para o pai, para a mãe, para Diego. Pensei em correr. E, antes mesmo de entender, minhas patas já estavam em movimento.

A decisão instintiva

Se fosse um cão treinado, teria sido ensinado a buscar ajuda em uma crise. Eu, Sombra, nunca aprendi. Mas o amor me ensinou. Corri até a porta da cozinha e bati com a pata. O pai me olhou, sem entender. Eu uivei. Uivei alto, como na crise respiratória. Uivei para dizer: “Me soltem”. O pai, no desespero, abriu a porta. Eu saí disparado pelo quintal, passando pela horta, pulando um canteiro de couve, evitando a poça de lama. O vento cortava meu rosto. O cheiro de sangue ainda me seguia, impregnado. A chuva recomeçou a cair fraca, mas eu não parei.

A rua estava vazia. As casas estavam fechadas. Apenas lamparinas iluminavam a calçada. Eu corri com toda a força que tinha. Senti as patas tocarem o asfalto quente. Senti o coração acelerado. Corri. Corri porque amava. Corri porque não havia telefone, corri porque cada segundo contava. O posto de saúde ficava além das casas coloridas, do bar do seu João e da padaria. Para mim, eram quatro quarteirões. Para uma pessoa, cinco minutos. Para um cão com adrenalina, dois.

A chuva molhava meu pelo. O cheiro de terra subia. Lembrei-me da minha vida na rua, quando corria para me esconder da chuva. Lembrei-me das esquinas que conhecia de cor. Lembrei-me do dia em que pensei que morreria sozinho, mas Diego me salvou. Agora, era minha vez.

Eu passava por portões, via pessoas nas janelas que me olhavam curiosas. Uma vizinha gritou:

– Sombra! O que aconteceu?

Não parei. Continuei. Meu objetivo era claro. Cheguei ao bar do seu João. Ele estava fechando as portas. O cheiro de cerveja, cigarro, fritura, e aquele som de futebol vindo da TV. Eu uivei alto. Seu João olhou. Levantei as patas nas pernas dele, lati. Ele me empurrou:

– Sombra, sai! O que foi?

Lati de novo. Dei um giro, como quem diz “Siga-me”. Ele entendeu algo errado e me deu um osso. Eu recusei. Lati mais. Ele finalmente compreendeu algo e saiu, perguntando:

– O que houve?

Eu corri em direção ao posto. Ele seguiu. Atrás, ouvi a voz dele chamando seu filho:

– Mateus! Vem! O Sombra está querendo nos mostrar algo.

Mateus, um adolescente de quinze anos, veio correndo. Era mais rápido que seu pai. E, assim, tive companhia. Corri. Eles correram. Chegamos à padaria. Cheiro de pão, donuts, açúcar no ar. O padeiro, um senhor velho e gentil, me viu pela janela. Eu uivei. Ele saiu e perguntou:

– Sombra? O que há?

– Precisa de ajuda? – disse Mateus, cansado.

Eu lati e continuei correndo. Finalmente, avistei a porta do posto de saúde. Era um prédio simples, com paredes brancas e janelas pequenas. Eu bati com as patas na porta. Empurrei com a cabeça. Nada. Estava trancado. Era madrugada; só atendimento 24h emergencial, mas era preciso interfonar. Uivei de novo. Mateus chegou, suado, e bateu na porta com força.

– Ei! Ei! Abre! – ele gritou.

O seu João ofegava atrás.

– Calma, menino. Deixa eu ver se tem alguém.

Tocaram a campainha. Um guarda apareceu. Era o senhor Roberto, que usava uniforme azul e dormia em um colchão no canto.

– O que vocês estão fazendo? É madrugada! – exclamou, com ar rabugento.

Mateus falou, aflito:

– Por favor! O Diego – aquele menino da cadeira de rodas – se cortou, está sangrando, e o sinal do telefone está fora. Precisamos de ajuda. A mãe e o pai estão em casa, mas não conseguem ligar. Precisamos de um médico. Rápido.

Eu uivei novamente, confirmando a urgência.

– Traga-o aqui – disse o guarda, acordando.

Mateus explicou:

– Ele não pode se mover muito. A perna está sangrando. Tem que ir até lá.

O guarda ficou hesitante:

– Eu não posso sair daqui sem autorização. Mas posso chamar a ambulância.

Ele foi até o rádio. Ligou para a ambulância. Pediu urgência. Relatou a situação. Explicou o endereço. Em minutos, sirenes soaram ao longe. Eu latia, andando de um lado para o outro, nervoso. Mateus acariciou minha cabeça:

– Calma, Sombra. Eles vão chegar.

Seu João respirava fundo, recuperando o fôlego. A chuva apertou. O cheiro de terra lavada subiu mais forte. Eu fechei os olhos por um segundo. Pensei em Diego, pensei em sua perna, pensei no sangue. Pensei na mãe chorando. Pensei na toalha vermelha. Uivei de novo, mais baixo, como um lamento. Mateus me abraçou. Um minuto depois, a ambulância chegou. Um clarão iluminou a rua, e as sirenes preencheram a noite.

A correria pela vida

Os paramédicos desceram correndo, com macas e kits. Um deles me viu.

– O que ele tem? – perguntou.

– Não é ele – respondeu Mateus. – É o menino. – Apontou para a nossa casa. – Ali, na casa amarela. Corre!

Eles correram. Eu corri na frente, guiando-os. Passei pela padaria, pelo bar, pelas casas. Cheguei na minha rua. A mãe estava na porta, segurando Diego com a toalha. Seus olhos se arregalaram ao ver a ambulância. O pai estava ao lado, quase sem respirar de ansiedade.

– Graças a Deus! – gritou a mãe. – Aqui! Ele está perdendo muito sangue.

Os paramédicos entraram. O cheiro de hospital entrou novamente na casa. Abriram suas maletas, pegaram luvas, gaze, soro. Um deles cortou a toalha. Outro pressionou gaze no corte. O sangue já não estava jorrando tanto. Era mais respingado. Mas era muito para um corte pequeno. Os paramédicos perguntaram:

– Ele toma algum medicamento anticoagulante? Tem hemofilia? – A mãe balançou a cabeça, dizendo que não, mas que a coagulação dele era lenta. Eles, então, aplicaram um hemostático, algo que ajuda a estancar o sangue.

Diego fechou os olhos, chorando. A dor era algo que ele conhecia, mas, naquele momento, não era a dor que o assustava; era a sensação de que algo poderia acontecer. O médico, percebendo, falou:

– Não se preocupe, garoto. Já está estancando. – Sorria para acalmá-lo. – Foi só um susto.

A mãe chorava, agradecendo. O pai respirava melhor. E eu, observando, sentia meus músculos relaxarem. O cheiro de sangue diminuiu. A cor voltou ao rosto de Diego. O paramédico completou:

– Devem ir ao hospital fazer alguns pontos. – Olhou para o corte. – É superficial, mas longo. Melhor garantir.

A mãe assentiu. A ambulância levou Diego e o pai. A mãe ficou para trancar a casa. Eu, no quintal, senti um cansaço enorme. Deitei-me ao lado da porta, encharcado de chuva, o coração ainda acelerado. A mãe ajoelhou-se, me abraçou e chorou no meu pescoço:

– Você salvou ele, Sombra. Você é nosso anjo. – E soluçava.

Eu a lambi e pensei em todas as vezes em que ela me colocou comida, em que ela me deu banho, em que ela me disse "meu menino". Era a primeira vez que ela chorava dessa maneira no meu pescoço. E eu, cansado, fechei os olhos, respirando fundo, sentindo o cheiro dela. Era o cheiro de lavanda, de bolo, de lágrimas. Era o cheiro de amor.

A noite no hospital

Fui deixado com a mãe em casa, mas não quis ficar. Fui até o portão, latindo, e, quando ela abriu, saí correndo novamente. Não importa que estivesse molhado. Não importava que estava cansado. Eu queria ficar com Diego. Queria ter certeza de que estava bem. A mãe, com um guarda-chuva, foi atrás. Chegamos ao hospital. O cheiro de álcool, de gente, de desinfetante, de algodão impregnava o ar. Lembrei-me da última vez, quando Diego teve pneumonia. Caminhei pelos corredores com cuidado. Algumas enfermeiras olharam com estranhamento, mas permitiram que eu entrasse, reconhecendo-me como cão de apoio.

Encontrei Diego deitado em uma maca, com curativo na perna, conversando com o médico. Quando me viu, sorriu, apesar de estar pálido.

– Sombra! – disse ele, esticando a mão. – Você conseguiu.

Eu me aproximei e encostei meu focinho em sua mão. Senti a pele fria. Lambi de leve, demonstrando que estava ali. Ele acariciou minhas orelhas.

– O doutor disse que vou ficar bem. – Sorriu. – Só vou ter que ficar uns dias com a perna enrolada. – Passou a mão no curativo.

O médico nos olhou e sorriu:

– Vocês são famosos aqui. Já ouvi falar de vocês. – Ele se inclinou, acariciou minha cabeça. – Parabéns, Sombra. Alguns cães não entenderiam que precisam correr. Você salvou o Diego. – Ele olhou para a mãe e disse: – Ele tem instinto de herói.

A mãe sorriu, ainda com os olhos vermelhos. O pai chegou e agradeceu mais uma vez. O hospital era cheio de cheiros fortes, de pessoas falando alto, de choros, de risos. Era um lugar de dor e cura. Minha cabeça girava um pouco de cansaço. O médico disse que Diego precisaria de uns pontos, mas que ficaria bem. Colocaram anestesia local. O cheiro de medicamento era enjoativo. Eu virei o rosto, mas continuei ali, próximo. Em alguns minutos, terminaram. O corte estava costurado. Em poucos dias, estaria cicatrizado. Diego recebeu uma injeção de vitamina K para ajudar a coagulação. A mãe ficou aliviada.

Quando saímos, a chuva havia parado. O cheiro de terra molhada era mais forte. Senti o ar fresco entrando nos pulmões. A lua refletia em poças no chão. Diego, na cadeira de rodas, foi colocado na ambulância de volta. Eu e a mãe fomos no carro de um vizinho. O pai ficou para resolver burocracias do hospital.

De volta ao lar

Ao chegar em casa, a mãe colocou Diego no quarto. Ele estava exausto. Eu me deitei ao lado da cama. Ele olhou para mim e disse, com voz fraca:

– Sombra, você correu por mim. – Uma lágrima escorreu, mas ele sorriu. – Você sempre disse que era meu dono. Hoje, eu percebi que é verdade. – Ele respirou fundo. – Eu não sei o que seria de mim se não fosse você.

Lambi suas lágrimas. Com o coração preenchido. Pensei nos quatro quarteirões, no cheiro de poeira, na chuva batendo nas minhas costas, no barulho das sirenes. Pensei em Mateus e seu pai correndo atrás de mim. Pensei na mãe chorando, no pai segurando Diego. Pensei no médico sorrindo. Pensei em tudo e senti que minha existência fazia sentido. Eu, que fui um dia abandonado, agora era razão de vida para alguém. E isso é maior do que qualquer cansaço.

Enquanto Diego adormecia, ouvi a mãe, na sala, ao telefone, contando para a avó o ocorrido:

– ... e aí o Sombra correu até o bar do seu João, levou até o posto… – ria e chorava. – Eu nem sei como ele sabia! – Pausa. – Sim, mãe. Sim. Eu sei. – Outra pausa. – Ele é da família. – E chorou.

O pai, ao entrar no quarto, me olhou com admiração. Ele nunca foi muito de elogiar. Era mais quieto. Mas, naquele momento, ajoelhou-se ao meu lado e sussurrou:

– Obrigado. – Seus olhos estavam vermelhos. – Obrigado por correr pelos quatro quarteirões. Obrigado por ser nosso herói. – E me abraçou.

Eu não precisava de palavras. Aquele abraço dizia tudo.

As cicatrizes que nos unem

Os dias seguintes foram de descanso e cura. Diego precisou de alguns pontos, uma semana de repouso e cuidados extras. O corte, antes vermelho, foi se transformando em uma linha fina. A mãe trocava o curativo com cuidado, e Diego reclamava que coçava. O pai comprou um spray que impedia coceira. Eu, ao lado, observava, vigilante. Cada vez que Diego se mexia bruscamente, eu o olhava, atento. Ele ria.

– Você virou guarda-costa agora?

Eu abanava o rabo. Ele tocava a cicatriz e dizia:

– Vai ficar uma marca. – Olhava para mim. – Vou lembrar de você toda vez que olhar pra ela.

Eu também teria marcas. Não físicas, mas marcas na alma. A marca de correr. A marca de ouvir meu coração batendo tão rápido. A marca de sentir chuva fria. A marca de lamber a lágrima dele, a marca de ver a lama em minhas patas. A marca de ter buscado ajuda. E, principalmente, a marca de saber que fiz o que precisava ser feito.

O episódio do corte fez a comunidade nos olhar de novo. Agora, éramos a história da crise respiratória, do vômito, e da corrida. A escola convidou o seu João e o Mateus para contar como ajudaram. Eles subiram no palco e relataram:

– Nunca imaginei que correria no meio da chuva atrás de um cachorro. Mas ali, não era um cachorro; era a vida de alguém. – Seu João disse, com os olhos brilhando.

Mateus completou:

– E a gente entende que, às vezes, o alarme não é um telefone. É um uivo. É uma pata na porta. É um cão correndo.

Todos aplaudiram. Alguns pais choraram. A professora olhou para mim e sorriu, murmurando: “Você merece uma medalha.” Diego olhou e riu. Eu pensei: a medalha de um cão é o amor.

Reflexões sobre correr

Correr sempre foi algo natural para mim. Correr para brincar, para fugir da chuva, para perseguir uma bola, para chamar atenção. Mas correr para salvar? Essa corrida foi diferente. Foi pesada e leve ao mesmo tempo. Pesada porque cada passo trazia o peso da responsabilidade; leve porque o amor me dava asas. Eu senti dores nas patas depois? Senti. Senti câimbras e tontura. Mas nada comparado à dor que seria perder Diego. Enquanto corria, pensei em nada e em tudo. Pensei no cheiro de bolo, no som do vômito, no brilho da faca, no uivo, no posto de saúde. Pensei na fragilidade da vida. Pensei em quanto nos amávamos.

Quando a mãe me acariciou naquela noite, ela disse:

– Você correu pela vida do meu filho. – E chorou. – Não tenho palavras.

É essa a essência. Às vezes, amamos tanto que corremos por vidas alheias. E não importa a distância, a chuva ou a dor. Importa chegar. Importa salvar.

Uma carta para quem nos lê

Querido leitor, se um dia você se perguntar se um animal é capaz de amar, lembre-se desta história. Lembre-se de que não precisamos falar para demonstrar. Às vezes, um uivo diz mais do que mil palavras. Lembre-se de que correr pode ser mais do que um exercício físico. Pode ser um ato de amor. Lembre-se de que, quando o coração aperta, às vezes precisamos abrir a porta e deixar o instinto nos guiar. E, se um dia você tiver um amigo de quatro patas, olhe nos olhos dele e saiba: ele daria cada passo por você.

Hoje, Diego está bem. O corte virou cicatriz. A crise respiratória está sob controle. E eu? Eu continuo ao lado dele. Continuo lambendo suas lágrimas e sorrisos. Continuo correndo, mas agora com menos aflição. Continuo uivando, mas mais por alegria. Continuo sendo o dono de quem me chama de dono. E, se algum dia a vida o colocar em perigo, sem dúvidas eu correrei de novo. Porque amar é isso: é estar disposto a correr, uivar, lamber, chorar. É transformar cada batida do coração em um passo que aproxima o outro da vida.

O mundo gira, as estações mudam, as crianças crescem. Mas algumas histórias ficam eternas. A história da corrida pela vida do meu dono é uma delas. Ela me lembra, a cada manhã, que a vida é frágil, mas que o amor a fortalece. Que correr não é fugir, mas chegar mais rápido onde se precisa estar. E que, quando as portas se fecham e os telefones falham, um uivo sincero pode acordar a esperança.

Eu sou Sombra, e esta é a história de quando corri para salvar Diego. Nunca pensei que fosse possível amar tanto alguém a ponto de correr até as patas doerem, mas aconteceu. E, se preciso, acontecerá de novo. Porque o amor não mede distância, não mede esforço. O amor corre.


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Capítulo 97 - O Último Uivo de Amor

Anos depois, Diego volta à árvore de Sombra e descobre que alguns amores nunca morrem — só mudam de forma. Capítulo 97 - O Último Uivo de Am...